Baseado em:
MAUSS, M. 1974 [1923 - 24]. Ensaio sobre a Dádiva. Forma e razão da troca nas sociedades arcaicas. In: Sociologia e Antropologia. v.II. São Paulo: Edusp.

27 de novembro de 2011

Algumas conclusões de sociologia geral e de moral


A proposta da obra pretende tratar os problemas com princípio heurístico, ou seja usa o métodos genéricos tanto em problemas genéricos quanto em problemas particulares.
Os fatos estudados são todos fatos sociais totais Sobre a noção de totalidade, muitas coisas foram  ditas. Mauss fala ora de "homem total", ora de "fato social total". “No primeiro caso trata-se da natureza indissociavelmelite psico-orgânica e social do homem. Aqui Mauss é fiel à tese durkheimiana do homo duplex. No segundo caso, trata-se do caráter indissociavelmente jurídico, econômico, estético, morfológico, etc. de todo fenômeno social”. São fenômenos ao mesmo tempo jurídicos, econômicos, religiosos, e mesmo estéticos, morfológicos etc. São jurídicos, de direito privado e público, de moralidade organizada e difusa, estritamente obrigatórios ou simplesmente aprovados e reprovados, políticos e domésticos simultaneamente, interessando tanto as classes sociais quanto os clãs e as famílias. Essas instituições têm um aspecto, além de religioso e econômico, estético muito importante. As danças, os cantos e os desfiles de todo tipo, as representações dramáticas que se oferecem, os objetos mais diversos que se fabricam, usam, enfeitam, pulam, recolhem e transmitem com amor, tudo que se com alegria e se apresenta com sucesso, os próprios festins de que todos participam, tudo, alimentos, objetivos e serviços, mesmo o "respeito", como dizem os Tligit, tudo é causa de emoção estética e não apenas de emoção da ordem da moral ou do interesse.
Na obra de EdgarMorin encontramos essa mesma perspectiva “Nas sociedades arcaicas, ornamentos, músicas, cantos, danças, acompanham todas as atividades da vida, exaltam as festas e as cerimônias”. O estado estético como “um transe de felicidade, de graça, de emoção, de gozo e de felicidade. A estética é concebida aqui não somente como uma característica própria das obras de arte, mas a partir do sentido original do termo, aisthètikos, de aisthanesthai, “sentir”. Trata-se de uma emoção, uma sensação de beleza, de admiração, de verdade, e no paroxismo de sublime; aparece não só nos espetáculos ou nas artes, entre os quais, evidentemente, a música, o canto, mas também os odores, perfumes, gostos dos alimentos, ou das bebidas; origina-se no espetáculo da natureza”.
Hölderlin disse, com razão, que “o homem habita poeticamente a terra”. Cabe complementar: “O homem habita poeticamente e prosaicamente a terra” [...] Ignorado uma dimensão antropológica capital: o ser humano não vive só de pão, não vive só de mito, vive de poesia. Vive de música, de contemplações, de flores, de sorrisos. 
Portanto, são mais que temas, mais que elementos de instituições, mais que instituições complexas, mais até que sistemas de instituições divididos, por exemplo, em religião, direito, economia etc. São "todos", sistemas sociais inteiros cujo funcionamento tentamos descrever. Estudamos as sociedades abrangendo seu estado dinâmico, não as estudamos como se estivessem imóveis, num estado estático o cadavérico. Foi considerando o conjunto que pudemos perceber o essencial, o movimento do todo, o aspecto vivo, o instante fugaz em que a sociedade toma, em que os homens tomam consciência sentimental de si mesmos e de sua situação frente a outrem. Há, nessa observação concreta da vida social, o meio de descobrir fatos novos que apenas começamos a entrever. Em nossa opinião, nada é mais urgente e frutífero do que esse estudo dos fatos sociais. Percebemos quantidades de homens, forças móveis, que flutuam em seu ambiente e em seus sentimentos.

O princípio e o fim da sociologia é perceber o grupo inteiro e seu comportamento inteiro. Todos estudam ou deveriam observar o comportamento de seres totais e não divididos em faculdades. Nós, sociólogos, observamos reações completas e complexas de quantidades numericamente definidas de homens, de seres completos e complexos. Descobriria ao cabo dessa pesquisa que as sociedades progrediram na medida em que elas mesmas, seus subgrupos e seus indivíduos, souberam estabilizar suas relações, dar, receber e, enfim, retribuir. Para começar, foi preciso inicialmente depor as lanças. Só então as pessoas souberam criar e satisfazer interesses mútuos, e finalmente, defendê-los sem precisar recorrer às armas.

Sobre a noção de totalidade, muitas coisas foram  ditas. Mauss fala ora de "homem total", ora de "fato social total". No primeiro caso trata-se da natureza indissociavelmelite psico-orgânica e social do homem. Aqui Mauss é fiel à tese durkheimiana do homo duplex. No segundo caso, trata-se do caráter indissociavelmente jurídico, econômico, estético, morfológico, etc. de todo fenômeno social.
Lembremos que esse estudo permite a Mauss ao mesmo tempo tocar o "concreto", pôr em evidência o mecanismo central de solidariedade que é a reciprocidade, criticar o utilitarismo das teorias econômicas e extrair um princípio heurístico que consiste em estudar os fatos como "fatos sociais totais". É para ele uma maneira de "tocar uma das rochas humanas sobre as quais se assentam nossas sociedades". O "mérito" de Mauss é, como sublinha Renê Maunier na resenha que fará do "Ensaio sobre a dádiva" para a Année Sociologique, demonstrar duas coisas: 1) "a vida dos ‘primitivos’ é mais complexa, mais ativa, mais dinâmica que acreditamos: é preciso não representá-la como ‘estática’; 2) "a vida econômica está profundamente ligada à moralidade e à religiosidade. Tudo está em tudo".

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