Baseado em:
MAUSS, M. 1974 [1923 - 24]. Ensaio sobre a Dádiva. Forma e razão da troca nas sociedades arcaicas. In: Sociologia e Antropologia. v.II. São Paulo: Edusp.

A necessidade de um pensamento complexo


Edgar Morin
Sociólogo, C.N.R.S./França
* tradução de Juremir Machado da Silva
A inteligência parcelar, compartimentada, mecânica, disjuntiva, reducionista, quebra o complexo do mundo, produz fragmentos, fraciona os problemas, separa o que é ligado, uni dimensionaliza o multidimensional. Trata-se de uma inteligência ao mesmo tempo míope, presbita, daltônica, zarolha. Elimina na casca todas as possibilidades de compreensão e de reflexão, matando assim todas as chances de julgamento corretivo ou de visão a longo termo.

Quanto mais os problemas se tomam multidimensionais, mais há incapacidade para pensar essa multidimensionalidade; quanto mais a crise avança, mais progride a incapacidade de pensá-Ia; quanto mais os problemas se tomam planetários, mais se tornam impensados. Incapaz de considerar o contexto e o complexo planetário, a inteligência cega produz inconsciência e irresponsabilidade.

Compreendemos então um problema essencial: complementar o pensamento que separa com outro que une. Complexus significa originariamente o que se tece junto. O pensamento complexo, portanto, busca distinguir (mas não separar) e ligar. O pensamento complexo é, portanto, essencialmente aquele que trata com a incerteza e consegue conceber a organização.

Apto a unir, contratualizar, globalizar, mas ao mesmo tempo a reconhecer o singular, o individual e o concreto. O pensamento complexo não se reduz nem à ciência, nem à filosofia, mas permite a comunicação entre elas, servindo-Ihes de ponte. O modo complexo de pensar não tem utilidade somente nos problemas organizacionais, sociais e políticos, pois um pensamento que enfrenta a incerteza pode esclarecer as estratégias no nosso mundo incerto; o pensamento que une pode iluminar uma  ética da religação ou da solidariedade. O pensamento da complexidade temigualmente seus prolongamentos existenciais ao postular a compreensão entre os homens.

Referência
Edgar MORIN, O Método 5 - a humanidade da humanidade: a identidade humana. Trad. de Juremir Machado da Silva. 2 ed. Porto Alegre: Sulina, 2003. 309 p. (La Méwthode 5 - l'humanitéde l'humanité, Editions du Seuil, 2002)